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MEDITAÇÕES

A Palavra de Deus é a relíquia das relíquidas, a única, na verdade, que nós, cristãos, reconhecemos e temos. (MARTIN LUTERO)

Quaresma - A caminho da Páscoa

Estamos a caminho da Páscoa, a mais importante festa cristã. Esse é um tempo de reflexão e preparação. Trata-se de uma oportunidade para entender melhor as razões dessa festa e da fé que carregamos. Fé necessita ser constantemente reafirmada, renovada. Se não for assim, ela caduca, perde o seu sentido e a sua força. Festas e comemorações cristãs acabam vazias e sem sentido.

Fé corre riscos. A tentação de Jesus no deserto é um exemplo (Lucas 4.1-13). O crente pode perder o rumo. Todo dom que recebemos de Deus, se não for bem cuidado, também pode murchar e morrer. Há tentações de todos os tipos a serem enfrentadas. Quando o único objetivo na vida de alguém é satisfazer as suas necessidades materiais (“pão”), aí é hora de ouvir: “O ser humano não vive só de pão.” (v.4) Poder e riqueza podem virar a cabeça de uma pessoa e fazê-la sentir-se como um deus. Aí é hora de ouvir: “Adore o Senhor, seu Deus, e sirva somente a ele.” (v. 8). Seres humanos são passageiros. A fé também pode ser tão inebriante, tornar a pessoa tão autoconfiante, a ponto de pôr o próprio Deus à prova. A pessoa se joga na vida e espera amparo e proteção de Deus para tudo. Aí é hora de ouvir: “Não tentarás o Senhor, teu Deus.” (v. 12b) A nós cabe o pedir e o trabalhar; a Deus, o realizar, conforme a sua vontade.

Páscoa não é festa apenas de cristãos. O povo de Israel também tem a sua. Jesus foi celebrá-la em Jerusalém. O texto de Deuteronômio 26.1-11 fala dessa grande festa. Os participantes devem trazer os primeiros frutos da terra. Alegria não pode faltar: “Fique alegre por causa de todas as coisas boas que o Senhor deu a você e à sua família e faça uma festa com os levitas e com os estrangeiros que moram onde você vive.” Fé precisa de comemoração, de alegria. Ritos e celebrações, como as de Deuteronômio, ajudam a renovar e manter acesa a chama da fé. Quem ignora isso corre o risco de ver a sua fé murchar.

Festa tem que ter as suas razões. Os versos 5 a 9 resumem o motivo da comemoração. Os antepassados do povo de Israel eram nômades: Não tinham lugar certo onde morar. Desceram ao Egito e lá foram escravizados. Em meio a maus tratos e aflições, clamaram por ajuda. Suas orações foram dirigidas ao Deus dos seus pais: “Então oramos, pedindo socorro ao Senhor, o Deus dos nossos antepassados. Ele nos atendeu e viu a nossa aflição, a nossa miséria e como éramos perseguidos. Com a sua força e com o seu poder, ele fez milagres, maravilhas e coisas espantosas, e nos tirou do Egito, e nos trouxe até esta terra que nos deu, uma terra boa e rica.” Páscoa é passagem da escravidão para uma terra de liberdade.

Deus se revela na história coletiva e pessoal do ser humano. O povo de Israel experimentou isso. Deus tem ouvidos atentos e coração misericordioso para os aflitos, perseguidos e explorados, que clamam pelo seu socorro. Ele ouve. Ele vê. Ele tem compaixão. Ele desce para libertar e conduzir um povo escravizado para uma terra que dá frutos abundantes. Essa é a Páscoa israelita. Jesus se alegra e festeja por isso.

Fé não se funda na capacidade humana de superar as dificuldades da vida, que todos nós temos. Pelo contrário, ela se funda na certeza de que há um Deus ao lado de quem sofre. Assim escreve o salmista: “Deus é o nosso refúgio e a nossa força, socorro que não falta em tempos de aflição.” (Salmo 46.1)

Quem não consegue perceber a ação libertadora de Deus na sua vida e na vida do seu povo, não consegue celebrar, comemorar, festejar.

Quem não percebe isso fica com uma fé sem recheio, sem referência, sem sentido, sem alegria. Acaba tendo uma fé ranzinza, cheia de regras e doutrinas inúteis.

Em Hebreus 11.1 nós lemos: “A fé é a certeza de que vamos receber as coisas que esperamos e a prova de que existem coisas que não podemos ver.” Aqui se fala de uma fé que olha para frente, que espera o que há de vir da parte de Deus. Deuteronômio fala de uma fé que olha para trás e contempla o que Deus já fez na história do povo de Israel. Fé saudável e madura olha pra frente, espera, mas não se esquece do passado, do socorro que Deus já providenciou na vida pessoal e coletiva.

O tempo da quaresma está aí para redescobrirmos os fundamentos e as motivações da fé que toma conta de nós. Assim como os Israelitas, precisamos ir às origens da celebração da Páscoa cristã. Queremos festejar a Páscoa com motivo, com conteúdo e, sobretudo, com gratidão e alegria.

 

P. Luis Henrique Sievers

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